segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Não é uma boa - Mania de ser natural

Quem diria que optar por comida natural pode se tornar um problema... É que em excesso, beirando a obsessão, essa atitude ganha nome de distúrbio: ortorexia. entenda o que signifi ca e saiba se você corre algum risco




A conscientização de se ter qualidade de vida e alimentação saudável entrou definitivamente em nosso cotidiano. Quem é que nunca parou diante de um rótulo para verificar se o produto é livre de gordura trans? Ou até pagou um pouco mais para ter uma fresca salada de verduras orgânicas? Recente pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (Ibope) mostra que a principal preocupação de 43% dos brasileiros é a saúde. Os “politicamente saudáveis” pregam: nada de gorduras, transgênicos, cafeína, comidas prontas, com aditivos ou substâncias químicas. Só que há uma linha tênue que separa o desejo por um cardápio equilibrado de uma doença. Quando a preocupação vira obsessão, para o médico americano Steven Bratman, autor de Health Food Junkies (Viciados em Comida Saudável), ela ganha o nome de ortorexia.


Uma dieta de qualidade – equilibrada em
nutrientes e com alimentos provenientes de
fontes seguras, não somente naturais –
traz, como benefícios, saúde, longevidade,
controle do peso, bem-estar e prazer



“A ortorexia nervosa é uma doença ainda não reconhecida pela Organização Mundial de Saúde (OMS), nem figura nos manuais de psiquiatria. É classificada como um Transtorno Alimentar Não Especificado (Tane) ou Transtorno Alimentar Sem Outra Especificação (TASOE). Os portadores desse distúrbio vivem examinando o que irão comer, provocando um efeito contrário ao de uma dieta saudável, ou seja, desequilíbrio alimentar”, explica a nutricionista Tânia Rodrigues, da RGNutri Consultoria Nutricional (SP). O distúrbio surgiu como uma distorção da idéia de que a comida natural é a melhor forma de alimentar corpo e alma. Mas os especialistas apontam ainda outros fatores que podem desencadear esse mal: o culto ao corpo e a excessiva publicidade de produtos supostamente saudáveis ou enriquecidos. O problema é que os ortoréxicos levam isso a sério demais. E, por causa das restrições ao que colocam no prato, acabam convivendo apenas com aqueles que dividem o mesmo cardápio ou consomem horas e horas pensando no que e como comer. A preocupação com a comida, então, chega a ser paranóica e a pessoa fica insuportável. O argumento principal dos que sofrem dessa nova patologia é o de não prejudicar a saúde a qualquer preço.Essa obsessão já estaria afetando 2% da população de países como os Estados Unidos. O professor de Medicina Preventiva e Saúde Pública da Universidade de Navarra, na Espanha, Javier Aranceta conta que a ortorexia é vista em seu país como uma “moda emergente” de “autistas alimentícios com tendência à infelicidade”. Para o especialista trata-se de um “fenômeno crescente”, que logo poderá ser equiparado a outros males como a anorexia, a bulimia e até mesmo a obesidade.

comportamento anti-social

O problema se inicia quando a preocupação com a alimentação começa a tomar grande parte do dia desses indivíduos. Os ortoréxicos não medem esforços para comprar seus alimentos: percorrem longas distâncias e pagam valores muito superiores aos dos produtos comuns. Além disto, se recusam a comer na casa de amigos e parentes, pois não sabem o que será servido. “Eles se julgam superiores às outras pessoas com hábitos ‘anti-saudáveis’ e tentam catequizar seus amigos e família”, atesta Tânia Rodrigues. Quando deixam de cumprir com seus objetivos, são tomados por sentimento de culpa e em seguida tornam-se ainda mais radicais, o que aponta o caráter doentio de seu comportamento. “A partir do momento em que a dieta ‘saudável’ se torna uma obsessão, em que a pessoa começa a se preocupar só com o valor nutricional do alimento, deixando de lado os aspectos sociais e sensoriais, já está no estágio de doença. Isso causa prejuízos para o indivíduo. Uma dieta realmente saudável não deve provocar esses transtornos e, sim, promover uma melhor qualidade de vida”, avalia a nutricionista. Segundo o professor Javier Aranceta, o ortoréxico se “enche” de produtos funcionais com o objetivo de ficar saudável, mas deixa de consumir 80% de outros que são mais importantes e básicos para o organismo.





nada a ver com vegetarianos
Muitos confundem o ortoréxico com o vegetariano e até mesmo o naturalista. Na verdade, ser natural é uma opção de vida e essa decisão está integrada ao jeito de ser do indivíduo, não representando para ele um problema. Para a pessoa que sofre de ortorexia, a alimentação é fonte de conflito e ela sente que precisa convencer os outros de sua opção ou então se distanciar deles. E o isolamento social é um prejuízo às vezes mais difícil de reparar do que os próprios danos físicos. É claro que a ortorexia também pode acarretar graves prejuízos à saúde, caso o indivíduo não substitua os alimentos que evita por outros que lhe ofereçam o mesmo valor nutricional. Tânia Rodrigues cita exemplos de problemas físicos que a doença acarreta: dores de cabeça e hipoglicemia, decorrentes de longos períodos em jejum; deficiências de vitaminas; distúrbios hormonais e do sistema imunológico. Ao excluir alimentos fundamentais para o organismo podem ocorrer ainda situações de desnutrição, anemia, deficiências ou excessos de vitaminas, minerais e outros nutrientes. Tudo isso desencadeia desde intolerância ou alergia a alguns alimentos, osteoporose por carência de cálcio, até problemas renais, depressão, ansiedade, hipocondria, dores musculares e apatia.





Pessoas que têm ortorexia demonstram
preocupação exagerada com higiene, forma
de produção, venda, industrialização e todos
os conceitos que envolvem o alimento






cuidados e tratamentos
O professor Aranceta recomenda medidas preventivas para deter o crescimento da doença, entre elas a educação desde a infância para obter hábitos alimentícios saudáveis. “O melhor para se ter uma dieta satisfatória é a variedade. Só aí está a possibilidade de adquirir todos os nutrientes”, diz o espanhol. Quando a doença já está instalada, o caminho da cura é bem mais árduo. O tratamento pede apoio nutricional – incluindo a reposição dos nutrientes que estão em deficiência – e psiquiátrico, para que haja um processo de reeducação alimentar e uma assistência que possibilite controlar o problema, desestimular práticas excessivas e prevenir as recaídas.



Fonte: Corpo a Corpo

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